domingo, 21 de outubro de 2007

Bordoada na indústria e a nova relação de consumo da música


http://www.inrainbows.com/ - esse é o mais novo endereço para trilhar o caminho da felicidade, pelo menos para os fãs da boa música, ou do rock. Trata-se do site oficial do Radiohead, umas das maiores bandas surgidas dos anos 90 para cá, que acaba de promover um estardalhaço na indústria da música. Desde 10 de outubro, a banda disponibilizou seu mais novo álbum "Inrainbows" para download ao preço que o consumidor quiser (que pode ser nada inclusive).A partir daí, a banda define um caminho que nos tempos de Internet já vem sendo trilhado, embora muitas vezes pela pirataria.


Baixar música de graça na rede não é novidade, e vez por outra, artistas disponibilizam singles gratuitamente e as gravadoras também já contabilizam as vendas a partir de número de downloads vendidos. A novidade é que dessa vez "Inrainbows" não ‘vazou’, nem há ninguém consumindo a obra de forma irregular. Preenchendo o cadastro no site, o internauta escolhe quanto pagar pelo disco. Isso acontece depois que a banda cumpriu seu contrato com a gravadora Capitol após o lançamento de "Hail to the thief", em 2003. O Radiohead está livre para vender seu novo álbum como bem entender.


Lobão, em 1999, também disse não às gravadoras e colocou “A Vida é Doce” à venda em bancas de revista. O cantor Prince, que já se arrisca em incursões digitais há algum tempo, encartou seu último álbum, "Planet Earth", na edição dominical do jornal "Daily Mail" em julho passado e vendeu 2,8 milhões de cópias distribuídas em um dia.


Percebendo que não poderá mais ficar em casa ouvindo o tilintar das moedas pingarem em sua conta com a venda de discos, a cantora Madonna assinou na terça-feira passada (16) um contrato com a Live Nation, empresa que organiza shows e turnês, para o gerenciamento total de sua carreira musical. Pelo acordo, especulado em 120 milhões de dólares, a rainha do pop deixou a Warner depois de 25 anos de contrato. Em comunicado oficial, ela diz "O paradigma nos negócios da música mudou, preciso acompanhar essa mudança. Pela primeira vez em minha carreira, a maneira como minha música pode chegar aos meus fãs está ilimitada. Quem sabe como meus álbuns serão distribuídos no futuro?". O Radiohead sabe.


O contrato inclui todas as canções e produtos musicais lançados por Madonna, de 49 anos, no futuro, incluindo a exploração comercial da marca da cantora, seus novos discos, suas turnês, merchandising, fã-clubes, websites, DVDs, programas de TV, filmes e projetos patrocinados. Isso não deixa de ser um sinal de que a proposta do Radiohead vem para fazer as gravadoras repensarem a maneira de explorar os artistas e os consumidores, além de humanizar o showbusiness: shows serão mais lucrativos do que a venda dos discos.


Há pouco mais de 25 anos, a Philips (em parceria com a Sony) lançava no mercado o compact disc digital áudio, invenção tecnológica que viria a revolucionar de forma definitiva a produção e a distribuição de música. O primeiro CD lançado foi o célebre "The Visitors", do Abba, famoso por ser também o último da bem-sucedida carreira do grupo sueco. Finalmente, oito anos depois de a música sair do disco para ganhar o espaço dos tocadores de MP3, algo começa a acontecer na relação entre ouvintes e artistas. Quem sabe aqui a pirataria visitará o limbo e os artistas independentes terão mais espaço para trabalhar. Previsões ainda são arriscadas porque a indústria não apresentou suas armas e ainda é cedo para saber se o consumidor aprenderá a respeitar o direito autoral, embora tenha a partir de "Inrainbows" a opção de até não pagar pela obra. Fato é que para registro, e como no caso de "Inrainbows" a oferta é em Euro, paguei nada pelo álbum que não tem preço.


A SAGA DA MELANCOLIA

Scratch na abertura, rock sincopadíssimo, pancada e melodia casadas com pirações eletrônicas... bem-vindos à primeira música "15 Step" que dá o tom do vigor do rock que a banda resgata. "One by one, come to us all", um por um, venham todos a nós, diz Thom Yorke na faixa arrebatadora que introduz o álbum "Inrainbows", o sétimo da carreira do Radiohead, banda famosa por hits como "Creep", "Paranoid android" e "Karma police", disponível apenas para download em www.inrainbows.com. É dos melhores, aliás. O estado etéreo do tempo que o Radiohead já havia provocado em "Idioteque" e, em certa medida, em "Everything in Its Right Place" (ambas de "Kid A") está de volta, porém mais rock 'n'roll do que nunca. Portanto, vá até eles.



Não se engane com a preferência pela melancolia de Tom York, o vocalista. Não se trata de um álbum de baladas. É rock revestido de Trip Hop até o fim, fruto de uma mente genial que não cansa de aguçar nosso espírito para despertá-lo da banalidade da dor. O Radiohead resolveu não apenas dar um tapa na indústria, mas nos ouvidos de quem há tempos não se lembrava o que era rock. "Bodysnatchers" tem guitarras que lembram o U2. Mais distorções e sonoridade suspensa em "Nude", bela melodia que transforma a melancolia em estado de prazer é a síntese do espírito da banda. Aqui você inflamará toda dor, ou toda dor-de-cotovelo que houver.


Batidas quebradas para triturar um coração adormecido em “Weird Fishes/Arpeggi”. A doçura segue com "All I Need" (que diz "você é tudo o que preciso") que desemboca nas cordas infinitas de "Faust Arp". A banda volta a atacar em "Reckoner", uma balada também arranjada com maneirismos vocais e sonoros que muito lembram o U2 novamente, até retornar a assombrar as almas com a sonoridade de "House of cards". Quando você pensar que está perto do fim, a linha de baixo de "Jigsaw falling into place" promoverá o recomeço de um novo orgasmo. Descanse com “Videotape”, a última, e começe tudo de novo.



Por isso e por mais, "Inrainbows" é a maneira mais eficaz de celebrar os dez anos do estupefaciente disco "OK Computer" e de pensarmos se ainda é apropriado chamar os álbuns de discos. Pelo menos por enquanto sim. Fãs também podem encomendar caixas contendo o novo álbum em CD e vinil, um segundo CD com faixas extras, artes e fotos, encarte com letras, além de um download (o pacote sairá antes de 3 de dezembro). A caixa custará 40 libras (aproximadamente R$ 160,00).



O QUE OS ARTISTAS PENSAM DO DISCO QUE NÃO TEM PREÇO

"Inicialmente imagino que eles estão fazendo uma provocação à subjetividade humana. Acredito que uma determinação dessa natureza no mundo eminentemente capitalista com certeza surpreenderá a uma indústria cultural que visa só e somente ao lucro, deixando a consciência planetária perplexa e, sobretudo, deixando a indústria sem o preparo necessário para ingressar no universo de solidariedade aos que constroem a arte com talento e muita dificuldade", Genildo Costa, cantor mossoroense.


"O que diabo é Radiohead? É banda de rock internacional? Ainda estou ouvindo os Beatles e no rock nacional Raul, Mutantes e Rita Lee. Sobre a questão da venda, de longe vou observar o mercado para depois avaliar. A princípio é estranho. Dizem que em alguns países avançados, bota-se gasolina sem o frentista e a turma não dá calote. No Brasil, quebraria os donos de postos. Acho que se praticássemos um preço justo no disco, em torno de R$ 20,00, evitariamos a pirataria", Zé Dias, produtor cultural.


"Este negócio de Internet está deixando doido a questão dos direitos autorais. Baixar música e não pagar por ela é estranho. Baixar e deixar por conta do consumidor o direito de estipular o valor, a princípio é democrático demais para uma sociedade consumista e de poucos valores éticos. É no mínimo estranho e vou pagar para ver", Khrystal, cantora.


“Não acho que é a morte do CD, assim como o livro que ainda não acabou. É o futuro mesmo. Sou desconhecida, mas estou vendo uma forma de me inserir nisso. Em muitas circustâncias não vale a pena disponibilizar tudo, mas para uma banda como eles é fantástico. O caminho para acabar com a pirataria é esse. O que as pessoas vão piratear se tem como baixar? Esse negócio de pagar o que você quiser vai levar as pessoa a ter consciência”, Simona Talma, cantora.

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4 comentários:

Freddy Simões disse...

Williams,

Muito bacana a postagem! E complementa, de certa forma, a minha matéria "Pirataria na rede e morte do CD", da qual percebi que você utilizou alguns subsídios. O novo disco do Radiohead é muito bom mesmo, comparado em qualidade somente ao "OK Computer" (se eu não me engano, o primeiro disco da banda).

Concordo com as considerações da cantora entrevistada na matéria: baixar música e deixar para o consumidor o direito de escolher pagar ou não pelo download é democrático demais para uma sociedade consumista e de poucos valores éticos. Essa assertiva foi ótima!

Unknown disse...

Antes de Ok Computer ainda tem The Bends e nao usei subsidios, copiei mesmo, nao tinha pq mudar.;.. Will

Anônimo disse...

Pois é "OK Computer" (1997) não é mesmo o 1º CD do Radiohead, O "The Bend" é de 1995 e só dois anos antes, 1993 foi lançado "Plabo Honey", este último (o 1º realmente) contém a belíssima música Creep, regravada recentemente de maneira completa tosca, no meu ponto de vista é lógico, pela banda Californiana Korn, porém não deixa de ser uma homenagem, mas não ficou legal mesmo...

Thom Yorke é quem tem o timbre correto para tal música e ponto... e para outras tantas músicas depressivas, melancólicas, mas nem por isso de sonoridade simplista e preguiçosa...

Não sei se o CD vai morrer ou não, sinceramente para mim tanto faria se TODAS e TODOS sem excessão pudessem adquirir a tecnologia necessária para ouvir, guardar, recordar, cantar junto, todas as músicas que quisessem, sei que quero demais, mas querer menos não irá mudar o fato de que poucos, bem poucos têm e sempre tiveram acesso a esses tipos de mudanças...

Por último parabenizo você Williams por sempre passar informações de maneira rica e prazeirosa...

Elis...

Acessem meu blog também:
http://wwwenquantopenso.blogspot.com/

Ficaria bem feliz com a participação de quem quiser...

Unknown disse...

bem lembrado, ainda havia "pablo"....