segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Até a vitória, sempre!

CHE: ícone que virou souvenir na mão do capitalismo

Ernesto Guevara de La Serna nasceu em 14 de junho de 1928, em Rosário, na Argentina, onde, aos dois anos de idade, teve sua primeira crise de asma, doença que o acompanhou pelo resto da vida. De família de classe média, Che, como ficou conhecido, pretendia estudar engenharia, mas aconselhado pela avó, partiu para a medicina. Em 1952, resolveu fazer uma viagem de motocicleta pela América Latina com o amigo Alberto Gramado (história retratada em filme de Walter Salles “Diários de Motocicleta”) e quando viu a pobreza pelo continente, decidiu que terminaria os estudos e assumiria sua alma política com o sonho de fazer justiça e acabar com as desigualdades sociais.
O primeiro casamento de Che foi com a peruana Hilda Gadea, com quem teve uma filha, Hildita. Em 1955, após viajar para a Bolívia e para Guatemala (a dependência que a América Latina tinha com relação aos Estados Unidos foi o motivo do fim de seu primeiro projeto político na Guatemala, quando a Casa Branca apoiou a derrocada do presidente Jacobo Arbenz), foi ao México onde conheceu Fidel Castro e se uniu a ele - primeiro como médico e mais tarde como comandante - em sua expedição armada para expulsar do poder o presidente cubano Fulgencio Batista (apoiado pelo Estados Unidos), em uma coluna guerrilheira que, a partir do leste da ilha, tomou Santa Clara (centro) e em 1º de janeiro de 1959 promoveu o triunfo da revolução. Depois do feito, Che adotou a nacionalidade cubana. Na ilha, conheceu Aleida March de la Torre, com quem teve Aleidita, Celia, Camilo e Ernesto.
De guerrilheiro para membro de governo houve poucos atritos com sua ideologia - próxima ao marxismo-leninismo radical, mas heterodoxa que seria chamada de "guevarismo" -, e, após desempenhar cargos como o de presidente do Banco de Cuba e o de ministro da Indústria, deixou a ilha em 1965. Na viagens que realizou, Che esteve no Brasil em abril de 1961, quando foi recebido e condecorado com a Ordem do Cruzeiro do Sul pelo então presidente Jânio Quadros.
Che deixou o governo para sair novamente pelo mundo propagando seus ideais de revolução, até que em 8 de outubro de 1967 foi capturado e executado no dia seguinte por soldados bolivianos na aldeia de La Higuera, aos 39 anos. O corpo só foi encontrado em 1997 e hoje está enterrado num mausoléu, na cidade de Santa Clara, em Cuba. Curiosamente, o homem que estava por trás do fuzil que matou o guerrilheiro, Mario Terán, recuperou a visão graças a cirurgiões cubanos, após uma operação de catarata. Nos 40 anos da morte de Che, a sua cidade natal - a argentina Rosário - prepara um calendário para comemorar, em 2008, os 80 anos do nascimento do guerrilheiro, ocorrido em 14 de junho. Já os exilados do regime castrista criticam uma figura que defendeu a extinção do imperialismo e a conseqüente recuperação dos países subdesenvolvidos.

Somente a luta armada e a revolução podem melhorar a vida dos pobres: são necessários "lares" de guerrilha para conduzir a um levante geral; o Terceiro Mundo é explorado por dois blocos: capitalista e comunista; a salvação é uma revolução que alia guerrilha, camponeses e reforma agrária; a revolução, assim como o advento de um "homem novo", procura recompensas morais e não materiais; a América Latina é uma só civilização, mestiça, com fronteiras artificiais, que têm que ser derrubadas; a revolução e a luta total contra o imperialismo devem ser mundiais.
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CONTRAPONTOS
Os historiadores e demais estudiosos se dividem quanto a representação de Che para a sociedade hodierna. Para o historiador e presidente do PC do B de Mossoró, Antônio Capistrano, Guevara "é o maior ícone revolucionário da América Latina e um dos maiores do mundo. A maior contribuição que ele deixou foi dedicar a sua vida a uma causa, um internacionalista. Um homem cuja pátria era o universo. Ele era argentino, mas não deixa de ser um herói do mundo. Ele era também um homem de idéias, deixou um legado cultural muito grande. Pensou uma sociedade justa, onde todo mundo teria direito", diz, rebatendo as críticas de veículos como a revista Veja, que publicou esta semana uma ode de desprezo ao guevarismo.
Capistrano diz: "Quem é exilado já está dizendo, fugiu. Nem Jesus é unanimidade. Cuba também tem seus opositores. O que a Veja fez, vem fazendo com os ícones do comunismo de todo mundo. O que é financiado pelas organizações norte-americanas não é de interesse que essas personalidades sejam bem-vistas", completa. Capistrano acredita ainda que o exemplo de Che inspire as ideologias políticas de hoje. "Acho que o exemplo dele de abnegação particular para interesse coletivo vale como exemplo. O cara que deixa de ser ministro e se mete na África, Ásia, nas selvas para fazer guerrilha, isso mostra exatamente a força da idéia e o caráter humanitário da figura de Che. Esse exemplo que faz com que os partidos comunistas, marxistas, sigam seu caminho. A luta armada tem sentido em momentos - o contexto é que determina isso. Mesmo existindo o predomínio do capital, da grande mídia, acho que hoje há o caminho para o diálogo", finaliza.
Por outro lado, o historiador Tomislav Femenick não poupa críticas ao universo guevarista. "Ele era um sonhador e como sonhador acabou se transformando num aventureiro a ponto de perder a ternura. Ele era tão aventureiro que incomodou o governo cubano. Ele foi um desastre dentro do governo cubano. No Brasil, de certo modo, Che contribuiu para a renúncia de Jânio Quadros quando foi condecorado. Existe muito mito em torno dele. Ele não tinha compromisso com a realidade, só com o sonho". Femenick não percebe influências das idéias de Che para a política local: "Não há influência na política local hoje. Ninguém pensa como Guevara, nem o toma como modelo. Ele foi aventureiro e não um pensador", mas pondera ao admitir que "não resta dúvida que ele contribuiu para humanizar o capitalismo, mas foi uma contribuição involuntária para quebrar a visão americana de que somos o quintal deles".

SOUVENIR

Che Guevara se tornou símbolo de rebelião e revolução. Seu status de ícone popular continua difundido pelo mundo, misturando política e arte. Na política, na América Latina vários políticos citam a luta de Che. Na Nicarágua, os sandinistas guevaristas foram reeleitos em 2006, após serem afastados do poder por 16 anos. O presidente boliviano, Evo Morales, sempre faz homenagens a Che. Na Venezuela, Chavez é conhecido por fazer discursos usando camisas com foto de Guevara. Che inspira ainda as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o Exército Zapatista da Libertação Nacional, no México. Em Cuba, o regime de Fidel une o sistema soviético ao culto à personalidade de Che. Nas artes, em outras palavras entenda-se no showbusiness/entretenimento, o capitalismo abusa do poder de subversão de valores para maquiá-lo de liberdade juvenil e promovê-lo como produto de consumo de massa. A indústria sabe manipular a imagem de Che para vendê-la como suvenir da moda e da música, por exemplo.
De qualquer modo, alienado ou não, o ideal de igualdade está solto na sociedade, embora embalado. De um lado a luta armada, a barbárie (de que lado venha) não é remédio para sanar os problemas; de outro, como se fazer notar pelo poder repressor do passado se não pela guerrilha? O produto Che - longe dos confrontos físicos, da luta armada - age sorrateiramente e sem mortes. Se a dialética do capitalismo se confirmar, o sistema estará lucrando hoje, mas criando e propagando as armas de sua própria destruição para amanhã.
"Sejam sempre capazes de sentir profundamente qualquer injustiça cometida contra qualquer um em qualquer parte do mundo. É a qualidade mais linda de um revolucionário", escreveu em seus últimos anos aos quatro filhos de seu segundo casamento.

MATERIALISMO HISTÓRICO

O presidente boliviano, Evo Morales, presta homenagem a Che Guevara e lança selo comemorativo aos 40 anos da morte do ex-líder, em Vallegrande, na Bolívia (Foto: Aizar)


A modelo Gisele Bündchen desfila de biquíni com a imagem de Che Guevara (Foto: AFP)

Em 2003, um dos maiores ícones do consumo capitalista, a cantora americana Madonna, apropriou-se da imagem de Che para lançar "American Life" e protestar contra o governo Bush. Não deu certo. Vendeu pouco, o disco é chato, mas valeu pela "briga" com os americanos.



O ex-jogador de futebol argentino Maradona mostra sua tatuagem de Che guevara (Foto: AFP)

2 comentários:

Anônimo disse...

Che, significa companheiro, amigo, parceiro... e essas com certeza foram algumas das qualidade de Ernesto.
Che foi considerado pela revista norte-americana Time Magazine umas das cem personalidades mais importantes do século XX.
Che é ícone, ídolo, referência de muita gente.
São por esses motivos e por outros que sua figura emblemática e o ser humano recebem tanto ataques quanto homenagens.
Alguém que desperta tanto interesse só pode desconcertar e incomodar mídias nem um pouco qualitativas quanto a Revista Veja, que momento propício esse para tentar enganar mais uma vez aqueles que a têm como referência jornalística, evidente que diversas pessoas deixaram/ão se envolver por tais afirmações no mínimo contestáveis quando não completamente absurdas e fora de próposito, como levar em consideração algo que tenta modificar opinões atestando falta de higiene?! haha...gargalhar é algo que se pode fazer perante "jornalismo" realizado de maneira tão aviltante e desonesta.
Viva a Chê... senão por quem realmente foi, mas acima de tudo pelo mito e esperança que nos deixou...

Elilson disse...

é interessante observar como a Revista Veja é tão influente!
A mídia manda nesse país;;;
Do mais, a matéria ficou muito envolvente.