sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Entrevista: Maurício Cézar.

O músico Maurício Correia Cézar Neto tem 27 anos de idade, toca vários instrumentos e possui um vistoso currículo. Já acompanhou várias personalidades importantes da cena musical pernambucana, como Antônio Nóbrega e Nena Queiroga. Além disso, atua como professor de música nos ambientes SESC e coordena um grupo de chorinho para crianças e adolescentes. Nesta grata entrevista, concedida por e-mail, ele fala sobre sua carreira, formação e referências.

Freddy Simões - Com que idade você descobriu sua vocação para música? Há outros músicos na sua família?
Maurício Cézar - Aos sete anos de idade, lembro-me de ter comprado uma flauta doce com o dinheiro da merenda que havia levado para a escola e isso certamente contribuiu para que eu tomasse gosto pela música. Antes disso, guardo na memória algumas músicas que me chamaram atenção e as tenho como madrinhas da minha carreira musical. São elas: Lilás (Djavan), Construção (Chico Buarque) e One Day In Your Life (Michael Jackson). Meu pai foi clarinetista amador e não tenho tantas lembranças dele como músico, também não tive o prazer de tocar ao seu lado, já que ele faleceu num acidente de carro em 1986.

FS - Quando começou a estudar música? Qual a sua formação?
MC - Não me lembro com exatidão se em 97 ou 98, mas meu primeiro contato concreto com a música foi no colégio estadual Joaquim Távora, em Niterói-RJ. Estudei teoria e vários instrumentos que estavam à disposição da banda da escola, entre eles, escaleta, trompete e percussão. Após alguns anos, me mudei para Recife e continuei em bandas de escolas, agora, me dedicando ao clarinete que havia herdado do meu pai. Aos treze anos, comecei a participar de uma banda evangélica na qual ainda tocava clarinete. Aos quatorze anos, já ganhava os primeiros cachês com o teclado e de lá para cá não parei mais. Estudei piano popular no conservatório pernambucano de música e com os pianistas Tonny Yucatan e Marco Diniz; no cavaquinho tive Marco César como orientador e esse sim foi, sem dúvidas, a maior referência musical que tive nessa fase. Conclui o curso de graduação em música pela UFPE e estou no final de uma pós-graduação em história das artes e das religiões pela UFRPE.

FS - Você toca piano, cavaquinho, violão e acordeon. Considera-se multi-instrumentista ou seu instrumento é mesmo o piano?
MC- Considero-me um curioso! Porém, procuro tirar proveito dessa curiosidade e sei que boa parte do que aprendi até hoje foi fruto disso. Instrumentista é um termo que procuro dar a pessoas que têm um domínio muito grande de técnicas e repertórios. Seguindo essa visão, não acredito que tenhamos mais de uma dúzia de multi-instrumentistas no Brasil.

FS - No Brasil, há grandes pianistas-compositores-arranjadores como, por exemplo, Gilson Peranzetta, Ivan Lins, Antonio Adolfo e César Camargo Mariano. Com quem você se identifica mais?
MC - Apesar de admirar todos, tenho uma afinidade maior com o trabalho de César Camargo Mariano e o considero um dos maiores arranjadores que o Brasil já teve.

FS - Quais músicos estrangeiros têm influência no seu trabalho?
MC- O pianista Oscar Peterson e o cantor Stevie Wonder são, para mim, referências de técnica e criatividade, porém admiro o trabalho de muitos outros.

FS - Dentre os figurões da MPB (Chico, Caetano, Gil, Elis, Nara, João Bosco etc.), você se diz mesmo fã confesso de Djavan. Acaso poderia mensurar a importância da música dele na sua vida?
MC- Sou sim muito fã de Djavan, mas confesso que atualmente estou cada vez mais apaixonado pelo trabalho de Chico Buarque. Acho um crime que a juventude não tenha acesso a sua obra através das rádios FM’s.

FS - Você compõe?
MC - Sim, componho músicas, mas não consigo colocar letras, essa parte eu deixo para meus parceiros.

FS - O que lhe dá mais satisfação: sua atuação como professor de música nos ambientes SESC ou o trabalho como músico da noite?
MC- Os dois trabalhos têm o seu lado gratificante e, no momento, não conseguiria me afastar deles.

FS - Fale um pouco sobre grupo de chorinho que você coordena.
MC - O projeto foi idealizado pelo presidente do SESC, o prof. Josias Albuquerque, que é um grande admirador do choro e grande incentivador do nosso grupo. Temos pouco mais de um ano, e começamos com crianças do zero! Quer dizer, crianças que nem ao menos sabiam ao certo o que era choro. Hoje, me sinto muito orgulhoso pelo trabalho que temos feito, e agradeço a Deus por ter me escolhido para essa tarefa. Tenho a oportunidade de apresentar “música de verdade” a essas crianças e adolescentes. E já é visível o avanço delas. Já podemos discutir repertório e conversar sobre compositores de uma forma satisfatória e prazerosa.

FS - Quais os grandes nomes do chorinho, em sua opinião?
MC - Vou citar alguns mestres: Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Altamiro Carrilho, Rossini Ferreira, Luperce Miranda(esses dois últimos pernambucanos). Entre seus discípulos estão: Hamilton de Holanda, Marco César, Yamandu Costa, Danilo Brito, etc.

FS - Quais as personalidades com quem você teve mais prazer em tocar ou gravar em estúdio?
MC - Antônio Nóbrega, certamente foi o mais divertido! Além disso, ele passa um clima muito bom no estúdio, e olhe que passamos por uma prova de fogo, já que o tom de uma das músicas foi alterado na hora da gravação e toda a digitação no instrumento teve de ser alterada.

FS - Qual a sua opinião acerca dos artistas que têm feito a novíssima MPB, tais como Jorge Vercilo, Zeca Baleiro, Ana Carolina, Maria Rita, Vander Lee, Vanessa da Mata, Roberta Sá, entre outros? Algum em especial lhe chama a atenção?
MC- Sei que minha resposta será polêmica, mas serei bem sincero. Todos acima têm seus méritos, principalmente por conta desses problemas com a pirataria. Admiro o trabalho de Jorge Vercilo e de Zeca Baleiro - esses dois pra mim têm um maior destaque no presente momento. Vivemos uma constante queda na qualidade técnica dos cantores e, apesar da evolução dos equipamentos de áudio, como retorno auricular, podemos perceber que a desafinação é constante nos shows de alguns desses artistas. Em alguns casos não sabemos se o artista está cantando ou gritando, as melodias não são tão marcantes como as do passado, vivemos uma queda constante na construção melódica, e a impressão que eu tenho é que agora só o ritmo interessa. Enfim, de trinta anos pra cá, a qualidade musica caiu. Tenho lá minhas dúvidas se a solução seria regravar músicas antigas, pois ouvi um dia desses a gravação de Beatriz (Edu Lobo e Chico Buarque), na voz de Ana Carolina, e tive uma decepção inigualável.

FS - No final do ano passado, a cantora Ivete Sangalo gravou um DVD no Maracanã lotado – em superprodução comparada somente às da popstar Madonna – e foi alçada definitivamente ao patamar de estrela maior da música brasileira e recordista de vendas no país, mesmo com a pirataria. Você gosta do trabalho dela?
MC - Não! Mas ela é muito simpática!

FS - E de Pernambuco, qual o artista que você mais admira?
MC - Silvério Pessoa, Alceu Valença e Antonio Nóbrega.

FS - A qualidade e criatividade da música popular brasileira entrou em declínio a partir dos anos 90 ou essa é uma opinião de críticos nostalgistas e conservadores que acreditam não existir nada melhor após a geração de Chico e Caetano?
MC - Concordo com os críticos nostalgistas e levanto uma questão: diga-me três músicas desses últimos anos que serão consideradas hinos, como Carinhoso, O bêbado e a equilibrista ou Wave? Diga-me três cantores que terão seus nomes lembrados, como Elis Regina, Nelson Gonçalves e Tim Maia? Diga-me três músicas que exprimam tanto sentimento quanto Atrás da porta, Suburbano Coração ou ainda Trocando em miúdos? Será que tem?

FS - Música é arte e, portanto, expressão da individualidade de seu criador. Para você, a música é forma de libertação, válvula de escape das mazelas emocionais ou profissão como outra qualquer?
MC - As três.

FS - Muitas vezes, quando se diz a alguém, "sou músico", é possível ouvir a pergunta "sim, mas você não trabalha?". Por quê, num país de musicalidade tão rica quanto o Brasil, ainda há quem enxergue a música de maneira tão preconceituosa e ignorante? Por que ainda é tão difícil se viver de música neste país e, principalmente, no Nordeste?
MC - Certamente o maior culpado disso tudo é o próprio músico que nunca se deu muito respeito. Uma prova disso é a Ordem dos Músicos, que deveria funcionar como um órgão fiscalizador assim como o Detran, mas, como sabemos, é comum termos que nos sentar em um barzinho para escutar um cara que não tem condições de cantar nem no banheiro. Então, eu lanço outra pergunta: eu poderia consultar pacientes ou levantar edifícios ou ainda julgar inocente ou culpado um bandido? A resposta é lógica, mas por que qualquer um pode se dizer músico? Cadê a fiscalização?

FS - Quais os seus projetos futuros? Casamento e filhos fazem parte dos seus planos?
MC - Estou amadurecendo projetos na área instrumental e pretendo iniciá-los no começo de 2008. Estarei me casando em dezembro e estou bastante feliz por isso. Tenho a mulher que pedi a Deus e, se tudo der certo no lado profissional, os filhos virão em breve.

8 comentários:

Anônimo disse...

Muito legal a entrevista com o músico Maurício Cézar. Fiquei curiosa para ver o trabalho dele, que deve fazer jus ao que Freddy disse: "virtuoso". Senti uma riqueza cultural em suas palavras. Achei interessante também o fato de ele ter se especializado em História das Artes e das Religiões. Obrigada, Freddy, por eu enriquecer meus conhecimentos sobre arte através de seu maravilhoso blog!

Beijos!

Anônimo disse...

A Sinceridade do Maurício Cezar é uma herança de família eu bem sei, e essa sincera visão e compreensão da musica de ontem e de hoje mostra este ponto forte da personalidade dele. Sincero e profundo na Vida e na Arte.

Parabéns Maurício e parabéns também ao pessoal do Blog Café Cultural.

Duda Lucena (USA)

Anônimo disse...

Esse é o grande Mauricio ,Dondinho para os de casa. Pelo pouco que acompanhei sua evolução musical, com sua simplicidade e grande profissionalismo estará fadado a grande sucesso. Parabéns pela entrevista.

Eduardo Vieira disse...

Além da simpatia e do carisma, Maurício é um dos maiores músicos que já tive a honra e o prazer de conhecer.

Além de grande músico, também é bastante conhecedor de cultura, no sentido mais amplo da palavra, tem senso crítico muito atilado e muita coisa interessante a dizer.

Seu trabalho como educador, também no sentido mais amplo do termo, é muito bonito e merece todo destaque.

Enfim, simpático, talentoso e dedicado, Maurício é uma daquelas pessoas que nos deixa feliz só de saber que ele existe.

Anônimo disse...

Freddyinho, eu lembrei de Maurício Cézar: é aquele que acompanhou você no SESC, naquele momento "piano e voz". Ficou lindooooo! Inclusive eu vi o vídeo no YouTube! Quanto a entrevista, achei Maurício super-inteligente e com um rico conhecimento no campo musical/cultural! Amei a entrevista! Só não concordei com a opinião dele sobre Ana Carolina! Parabéns pelo blog maravilhoso!

Anônimo disse...

Não conheço o dito cujo, o referido entrevistado. Perdoe-me...
Mas, já gostei dele! Sabe das coisas! Inteligente e de bom gosto... Mencionou meu amado Vercillo, e meu amigo Silvério. Gostei do cara.

Hum, Freddy e sua nova façanha...
Entrevistador?? Repórter??
Olhaaaa...
Se superando! Esse é o meu amigo!!!
Muito bom!! Já disse, devia fazer Jornalismo... (risos).

Diego Moretto disse...

Não conheço o trabalho dele, mas pelo o que diz deve ser bem interessante não?!
Parabens pelo espaço oferecido ao cara, isso é extremamente de boa índole.

Rapaz, acho que vc não entendeu meu texto, hehehehe. Eu não coloco Lula como culpado daquilo tudo não. No texto, Lula é apenas mais um caso de ignorancia, semelhante aos apresentados. Mas seu comentário foi ótimo. Muito obrigado! Volte sempre.

Josenildo disse...

E o Grupo Xamego?